quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Verdades Secretas (e incômodas)

Somos Todos Barusco?
Existem diversas formas para se definir o que é um cara chato, inclusive esta, de minha lavra: é o sujeito que num churrasco de confraternização entre amigos, passa o tempo todo dizendo que a carne vermelha faz mal a saúde, o sal grosso aumenta a pressão, o álcool é um veneno para o fígado, além de citar todas as substancias químicas presentes na composição dos refrigerantes. Para arrematar diz que o gás metano desprendido pelo gado contribui para o aquecimento do planeta.

Dito isto, informo que o chato da vez sou eu. No meio da bonita e emocionante manifestação de cidadania ocorrida no dia 16 de agosto, que teve como alvo central protestar contra a corrupção desenfreada que tomou conta do país, fiquei imaginando quantos ali presentes gritando slogans contra o governo, destilando sua indignação contra algumas figurinhas carimbadas da corrupção nacional e vocalizando palavras de ordem de apoio às ações do Juiz Sérgio Moro, teriam igualmente se corrompido, provado o gosto de um pixuleco, se a oportunidade tivesse passado em frente a sua porta.

Tomemos como exemplo o caso de Pedro Barusco ex-executivo da Petrobras e atual delator premiado. Ele se formou em engenharia ingressou na Petrobras por concurso, galgou diversos postos até chegar a Superintendência de Engenharia, cargo que só se ocupa por mérito e competência. Mas vamos imaginar o que teria acontecido se ao invés de fazer engenharia tivesse escolhido a medicina e aberto um consultório de pediatria. Evidentemente é difícil responder, mas uma das possibilidades sugere que poderia estar participado das passeatas contra a roubalheira no país, pois, possivelmente, a corrupção contraria todas as regras de cidadania que aprendeu ao longo da vida. 

No rol dos acusados dos diversos casos corrupção, e não estamos nos referindo apenas a aqueles que ganharam mais destaques na mídia- o mensalão e o petrolão- e sim todos que foram descobertos nas empresas estatais, fundos de pensão, assembleias legislativas, câmara dos vereadores, poder judiciário, prefeituras e governos dos estados e federal, são milhares de casos que vieram à tona nos últimos anos, grande parte dos envolvidos eram pessoas com boa formação intelectual, oriundas de famílias bem estruturadas que lhes transmitiram exemplos edificantes em relação a valores éticos, justiça e honestidade.

A variedade do perfil profissional e funcional dos condenados ou acusados de corrupção comprova o ditado que no Brasil a ocasião faz o ladrão. Dentre os envolvidos temos ex-guerrilheiros, metalúrgicos, sindicalistas, representantes comerciais, arquitetos, secretarias, engenheiros, economistas, advogados, juízes, ministros, veterinários, ambientalistas, empresários, cientistas, políticos, médicos, comunistas, militares, religiosos, ateus, crentes, ex-líderes estudantis, síndicos de prédio, gerentes da área de compras de estatais e empresas privadas, dirigentes do MST, etc...enfim, o arco da corrupção contempla todo extrato social da atividade nacional. 

Pode-se dizer que em qualquer país o grupo de corruptos abrange os diversos segmentos da sua elite intelectual e política. Ok, verdade, só que o Brasil ocupa a 69º lugar no ranking mundial da corrupção. Trocando em miúdos, enquanto o índice do país menos corrupto, a Dinamarca, é 92, o coeficiente do Brasil é 43, ou seja, a corrupção aqui não só é culturalmente tolerada, como também praticada em doses maciças pela sociedade, e não apenas por aqueles que aparecem nos noticiários, que é a ponta do iceberg. No Japão um corrupto mequetrefe para os padrões brasileiros, renuncia, saí da vida política ou, em casos extremos, se suicida, aqui ele vira presidente - república, clube, câmara, senado, assembleia legislativa, escola de samba ou algo no gênero.  

A cultura da corrupção é diariamente comprovada através de um procedimento comum praticado por considerável parcela da população, a pessoa para não ser multada no trânsito ou para o seu estabelecimento não levar um auto de infração, apela para o famoso jeitinho (aí seu guarda/fiscal não dá para dar um jeitinho). 

O pixuleco do petrolão, considerado o “jeitinho alfa”, só causou espanto e indignação devido a sua grandiosidade, mas, num país que absolve quem rouba mas faz, vide Barbalho, Collor, Renan, Maluf, que sempre se reelegem, a corrupção é vista  como algo que faz parte da rotina do brasileiro como o torresmo, chopp e futebol no dia de domingo e o carnaval. Tradicionalmente, protesto contra corrupção não leva mais que meia dúzia de gatos pingados para as ruas. 

Pode ser que a hipótese de que parte dos brasileiros é honesta por falta de oportunidades seja radical, mas, infelizmente, os fatos que diariamente ocorrem em todo o país sinalizam nesta direção, dando outro sentido a letra da música "aí se eu te pego, delícia, delícia", cantada por alguns enquanto sonham acordado com pixulecos. 

Mas nem tudo está perdido, como mostra o estudante Lucas Yuri Bezerra, de 16 anos de Brasília, que achou no lixo uma carteira com R$ 1,6 mil. Embora sua mãe esteja desempregada e sem recursos, não pensou duas vezes, decidiu devolver o dinheiro ao seu dono, que, veio se saber, era um pedreiro aposentado que sofre de problemas no joelho e anda com dificuldades.  Detalhe, o adolescente foi tachado de otário por seus amigos de turma que diziam para ele ficar com o dinheiro. Enquanto tiver no Brasil pessoas como Lucas, existe esperança.

2 comentários:

  1. Pois ~e, mestre blogueiro, ainda temos casos como o do Lucas... que nem deveria ter chamado atenção, já que seria o que todos deveriam fazer... Mas como estamos enfrentando uma epidemia de grandes proporções, esse pequeno ato de honestidade vira manchete... Continuo desanimada, civicamente...

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  2. O que escrevi retrata a realidade, e ela é desanimadora, mas existe o Fator Moro, uma fagulha no final do túnel. Vamos torcer e apoiar as ações dele do MP e PF.

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