terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Vidas Secas Na Região dos Jardins

Será que o Brasil Mudou?
Se Graciliano Ramos ressuscitasse possivelmente escreveria hoje o livro Vidas Secas de forma diferente e bem mais dramático. O romance original versa sobre um casal de retirantes miseráveis nordestinos, seus dois filhos e a cachorra vira lata chamada Baleia expulsos do seu rincão devido à seca inclemente. A estória se desenrola no decorrer da caminhada em busca de um destino melhor, tinham muito pouco a perder, pois a vida deles sempre foi muito sofrida caracterizada pela escassez de água, recursos, comida, cultura e palavras. A única coisa que abundava na família era a fome e pobreza.

A versão moderna contaria o drama de um casal paulista, seus dois filhos e a cadela, uma Lulu da Pomerania chamada Scarlet, que moram numa mansão situada na região dos Jardins no centro do polígono da seca paulistana, que os moradores chamam de la sécheresse polygone para reduzir a desvalorização dos imóveis, que, igualmente, foge da seca inclemente que assola São Paulo, não chove há meses, os reservatórios secaram, a água acabou, mas a situação é bem mais dramática que a da família nordestina, pois o chefe da família estava preso devido operações de superfaturamento feitas pela sua empreiteira com órgão estatais, o que ocasionou diversos processos de corrupção e formação de quadrilha, sua residência atual Curitiba.

Sua esposa, uma dondoca botoxada, está  depressiva devido à perda do patrimônio e do orgulho, o caso saiu em todos os jornais e TVs. Antes do debacle financeiro e patrimonial ela contribuiu a sua maneira para ajudar a acabar com o problema hídrico paulistano. Parou de beber água nativa para economizar o precioso líquido nacional, quando estava no Brasil só bebia água importada da Áustria, passava a maior parte do ano em Paris, ia para lá para ajudar a economizar a água brasileira, usava a francesa, o único aspecto positivo que compensava o sacrifício do exílio hídrico era que o banho com água parisiense era bem mais charmoso.

Outra medida de guerra tomada foi proibir a criadagem de lavar os cinco carros importados três vezes por semana, agora seriam só duas vezes, a exceção da Porshe e a Ferrari do marido.  Os banhos de banheiras de hidromassagem feitos diariamente com sais importados, utilizados para relaxar e rejuvenescer a pele passou para apenas três vezes por semana, o que deixou o seu rosto envelhecido, obrigando-a a fazer mais uma aplicação de botox na testa,o que debitava  na sua cota de sacrifício e cidadania, afinal era uma mulher engajada, trabalhava em projetos voltados para a responsabilidade social, como o  do  Dog Garden, uma ONG voltada para tratar cães de raça da região dos Jardins e adjacências com problemas de identidade ou bipolar, síndrome que poderia fazê-los atacar seus donos ou ficar prostrado não querendo mais saber de viver.

Tudo ia bem, mas de uma hora para outra seu mundo deu uma cambalhota, o Ministério Público ofereceu denúncia contra Armando, seu marido, o juiz autorizou a quebra do sigilo bancário e telefônico, foram bloqueados bens e as contas bancárias no Brasil e, também conseguiram identificar aquelas abertas em paraíso fiscais em nome do marido, no seu e dos filhos. Não tinha dinheiro para nada, foi obrigada a tirar os filhos da escola americana e matriculá-los numa escola pública, passou a comprar acém, as amigas a evitavam não era mais convidada para jogar golfe e participar das reuniões da DogGarden ou da PauliWoman, outra entidade que fazia parte como voluntária, que era uma associação de mulheres que dava apoio ao Movimento LGBT, e promovia viagens técnicas para conhecer as Paradas Gays de Nova York, Paris, Bangcok, Berlim, Tel Aviv, Flórida, Amsterdam e São Francisco, as do Brasil não, porque o nível era muito baixo.

Embora o marido das suas amigas, agora ex-amigas, também tivessem o rabo preso, eles nunca foram pegos pelo Ministério Público ou Polícia Federal, o único flagra dados foi com as amantes, mas isto era um problema menor, afinal a maioria também dava expediente fora de casa, então tudo ficava no zero a zero.

Por isso embora a seca fosse geral, elas tinham dinheiro para administrar a falta de água, comprando caminhões pipas ou passando longa temporada no exterior, mas quem não tinha dinheiro nem para pagar a criadagem e mensalidade das escolas dos filhos tinha que emigrar, se virar sozinha, pois o imbecil do marido, que sempre contou vantagens e debochava da justiça, deixou rastros e foi em cana e, se bobear, é capaz de levar toda a família junto, pois diversas operações heterodoxas foram feitas em seu nome e na dos filhos.

Também o que ela podia esperar de um cara com o nome de Armando, ele é sempre suspeito, o nome o entrega, ninguém se chama Armando à toa. Hoje se arrepende de não ter casado com Fortunato, que também dava em cima dela e agora está podre de rico, é dono do frigorífico Fortuboi, mas na época era meio duro, a família dele pertencia ao andar debaixo, não tinha cultura, assim resolveu apostar no candidato de sobrenome reluzente que frequentava o high society paulistano. Merda.

Mas o cúmulo da humilhação foi ter que ouvir de uma prima que ela sempre esnobou e morava em Sinop norte de Mato Grosso e casou com um sujeito bronco que ficou rico com uma madeireira,  chamava ele de cafetão de árvore, que poderia dar guarida para ela e os filhos, tendo oferecido uma casa para morar que estava vaga localizada na periferia da cidade, mas todos teriam que trabalhar, pois não poderia sustentar a família, ela poderia ficar na loja como vendedora e os filhos poderiam escolher entre o almoxarifado ou dirigir caminhão, tinham uma frota para fazer as entregas. Ouviu tudo morta de ódio e foi obrigada a engolir o orgulho em seco e dizer que ia estudar a proposta. Piranha.

O plano que tinha para recomeçar era tentar chegar à terra prometida, Miami, onde as pessoas são felizes, não falta água e não tem esta gentinha que é obrigada a aturar no Brasil, durante todos estes anos teve que posar de politicamente correta, por uns momentos sorriu ao pensar que ficar na merda tem lá suas vantagens. Mas como não tinha dinheiro para abrir um negócio e poder ficar legalmente no país, ia tentar entrar como ilegal pela fronteira do México, tendo pago a um coiote para fazer a travessia, chegando  ia ver se conseguia trabalhar num hotel, pois falava quatro idiomas e botaria os incompetentes e mimados dos filhos para correr atrás.

Quando pensou no filhos seu humor ficou ainda mais azedo, pois o mais novo estava deprimido por ter sido obrigado a deixar o namorado para trás, não parava de chorar, só faltava isto, ter que aturar fossa. A pior coisa que tem é gay pobre, pensou, o rico não se abala, tem outras diversões, a fila  anda rapidinho. Outra vantagem de ficar pobre é poder falar o que pensa, antes tinha que posar de mulher rica moderna de cuca aberta, dizia para as amigas que estava feliz porque o filho estava apaixonado pelo amigo da escola, tinha encontrado sua alma gêmea, dormiam juntos em casa, foi até entrevistada por um programa de TV focado em pais de pessoas de gêneros diferenciados. A verdade é que ficava possessa com a boiolagem do filho, isto a deprimia. Agora pode falar o que pensa à vontade, pobre é conservador e ela agora pertence a categoria.  


Bem, a estória continua e não se sabe como vai acabar, talvez num restaurante, numa pizza coletiva, no Brasil  tudo pode acontecer, o que inclui o nada, sempre favorito quando os protagonistas são políticos e empresários.

2 comentários:

  1. Mas a água de Paris é péssima viu! Muito alcalina! Estraga o cabelo!

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  2. Lá vem vc com detalhes. Caxambu tb tem água alcalina e as pessoas vão lá para se tratar. A da minha casa é do Paraíba do Sul, argh!

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